segunda-feira, março 16, 2009

PROFISSÃO

Comentários de Tuiávii, chefe da tribo Tiavea, nos mares do sul, aos seus irmãos, quando regressou de sua viagem à Europa:

É difícil dizer o que é “profissão”, mas todo europeu tem uma. É uma coisa que se deve ter muita alegria ao fazer, mas raramente isso acontece. Ter uma profissão significa fazer sempre a mesma coisa, uma só coisa, e tantas vezes que se consegue fazê-la de olhos fechados e sem esforço algum. Se com minhas mãos outra coisa não faço além de construir cabanas ou tecer esteiras, construir cabanas ou tecer esteiras é minha “profissão”.

Lá na Europa existem pessoas que já não podem correr, pois criam muita gordura no ventre, como os porcos, porque têm que estar sempre parados, obrigados pela profissão. É raro ver um europeu que salte, que pule como criança, depois que fica adulto. Pelo contrário, quando anda, arrasta o corpo, como se alguma coisa travasse o seu movimento. Ele disfarça, nega esta fraqueza, dizendo que correr, pular, saltar não são decentes para um homem importante. Hipocrisia: é que seus ossos estão duros, sem movimento e seus músculos não têm mais animação porque a profissão o fez sonolento e morto. Ela lhe destrói a vida, insinua-lhe bonitas coisas, mas na realidade lhe chupa o sangue.

A profissão também prejudica o europeu de outra forma. Existe ódio ardente entre os homens que têm profissões diferentes. Todos estão sempre comparando as suas profissões, cheios de inveja e má vontade. Fala-se em profissões elevadas e baixas, embora todas sejam apenas atividades parciais. Por causa da profissão, o europeu vive confuso. É claro que não quer pensar nisso, mas ele nunca conseguiu nos fazer compreender porque havemos de trabalhar mais do que Deus exige para que possamos comer o necessário, cobrir a cabeça com um teto e nos divertirmos com as simples festas da aldeia. O europeu suspira quando fala no seu trabalho, como se uma carga o sufocasse. O Grande Espírito não quer certamente que fiquemos cinzentos por causa das profissões, nem que nos arrastemos feito as tartarugas e os pequenos animais rasteiros da lagoa. Ele deseja que continuemos felizes e firmes em tudo quanto fazemos; que não percamos a alegria dos nossos olhos e nem o contentamento com a simplicidade da vida.

Extraído do livro "O Papalagui", de Erich Scheurmann, escrito em 1920..

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